FONTE: Tribuna do Interior (Valdir Bonete)
Discutir assuntos de interesse do bairro onde mora, não atrai a atenção e menos ainda a participação dos mourãoenses. É o que se pode concluir pelo número de pessoas que costumam participar das reuniões das associações de moradores. Na maior parte desses encontros, o público presente não chega a 2% do total de moradores do bairro. O município conta com 38 associações de moradores, que representam cerca de 70 bairros, além de 6 na zona rural e uma no distrito de Piquirivaí.
“Tem bairros com mais de três mil moradores e as reuniões não reúnem nem 50 pessoas. Isso é lamentável porque descaracteriza até mesmo a representatividade. A razão de existir de uma associação é o envolvimento comunitário para cobrar melhorias do poder público e isso só se consegue com participação”, argumenta o coordenador de desenvolvimento Comunitário do município, Carlos Rogério Alves Ferreira.
Há um ano e meio como presidente da Associação de Moradores do Jardim Albuquerque, Valdir Silva afirma que o bairro conta com mais de 1.000 moradores, mas as reuniões da associação não atraem mais que 20 pessoas. “Há muito pouco interesse em participar”, afirma. O próprio resultado da eleição no bairro é uma evidência da falta de participação: apenas 240 votantes.
Silva afirma que as reuniões são realizadas a cada três meses. “Se não tiver um assunto muito importante para tratar não adianta ficar marcando reunião porque as pessoas não comparecem mesmo”, justifica. A associação comandada por ele é uma das três que contam com sede. As outras duas são a do Lar Paraná e da Vila Urupês.
O desinteresse dos moradores também é sentido pelo presidente da Associação de Moradores do Conjunto Cohapar, Dione Valério da Silva. “Infelizmente as pessoas estão mais preocupadas com o próprio interesse do que no coletivo”, analisa. Na tentativa de incentivar a participação, ele pretende aumentar o número de integrantes na diretoria, que atualmente é formada por 12 pessoas.
Dione afirma que os moradores costumam centralizar as reivindicações da comunidade na figura do presidente. “Eles mais procuram minha casa do que participam de reuniões. Acreditam que ao me elegerem transferiram a responsabilidade de lutar pelas coisas do bairro”, ressalta. Segundo ele, o bairro conta com mais de 4 mil moradores, mas a reunião com maior participação contou com 130 pessoas.
Uma alternativa encontrada por Dione para manter os moradores informados sobre as ações da associação foi a prestação de contas em domicílio. “Faço prestação de contas de tudo o que é encaminhado ou conquistado e levo de casa em casa”, afirma.
A presidente da associação do Conjunto Capricórnio, Marlene Freitas, diz que os moradores só procuram a associação quando têm algum problema. “Nas reuniões são poucas pessoas. O bairro tem mais mil moradores mas as reuniões não chegam a 30 pessoas”, conta.
Cultura - Para o coordenador Rogério Ferreira, vários fatores contribuem para o desinteresse da população. Um deles é cultural. “A sociedade está muito individualista e poucos têm senso de coletividade. Devo ter consciência que não sou apenas um indivíduo, faço parte de um coletivo. Os problemas do posto de saúde, da escola, não existem apenas quando eu sou atingido. Tenho que me interessar por tudo o que envolve a comunidade”, pondera.
Segundo ele, nos bairros periféricos, onde a população tem mais problemas sociais, há maior envolvimento. “Nas associações da área central a participação é menor. Acredito que pelo fato das demandas serem maiores nos bairros há maior envolvimento coletivo para conseguir atenção do poder público”, frisa Ferreira.
Culpa não é só dos moradores
A falta de participação na associação não é culpa não só dos moradores. Em muitas delas, falta empenho da própria diretoria. “Muitas pessoas nem sabem que existe associação. Quando a diretoria realmente é atuante reflete em maior participação”, afirma Rogério Ferreira. Há casos de entidades, por exemplo, que não costumam fazer reuniões e quando realizam não comunicam a população, apenas os membros da diretoria.
“A gente não convida todo mundo. Primeiro porque não dá tempo e também não adianta porque eles não vêm mesmo”, justifica Valdir Silva, presidente do Jardim Albuquerque.
A presidente do Conjunto Capricórnio, Marlene Freitas, reconhece a falha da diretoria. “Não posso culpar só os moradores, a associação também peca. É um conjunto de fatores. A gente também tem o nosso trabalho e o tempo da gente às vezes não é o tempo dos moradores”, reconhece, ao revelar que em um ano realizou apenas três reuniões.
No Cohapar, Dione Valério também não costuma convocar reuniões, apesar do estatuto prever encontros pelo menos a cada dois meses. Tanto ele quanto Marlene acreditam que a falta de uma sede própria contribui para o desinteresse. “Uma sede facilitaria porque geralmente usamos residências das pessoas para fazer reuniões”, justifica Marlene.
Rogério Ferreira lembra que as principais conquistas comunitárias estão fundamentadas na mobilização popular. “Quando a população se mobiliza, ganha força e é ouvida”, afirma, ao defender um trabalho de articulação integrada entre as associações para se criar uma cultura de participação. “O poder público também tem que dar suporte para que a comunidade se fortaleça e a diretoria tenha condições de trabalhar melhor”, completa.
Interesses políticos na associação
O conflito entre interesses políticos e comunitários é um dos agravantes nas associações de moradores. “Há casos de pessoas que assumem a associação simplesmente por interesses políticos. Isso não é correto e a população tem que ficar atenta. O ideal é quando uma candidatura desse líder surge naturalmente, sendo colocada numa disputa eleitoral por vontade da comunidade e não por ambição pessoal”, frisa Rogério Ferreira. Ele acrescenta que só com a participação é possível identificar os oportunistas.
Os interesses partidários de grupos políticos, segundo Dione Valério, interferem diretamente nas associações. “Se o administrador público não é da mesma corrente política do presidente, não faz questão de realizar e com isso vira uma guerra que não deveria existir”, argumenta.
Para ele, a falta de realizações do poder público contribui para a falta de participação dos moradores e desanima a diretoria. “A gente fica três ou quatro meses pedindo uma poda de árvores; tem locais que esperam tapa-buracos há anos. E quando a cobrança é feita apenas pelo presidente, na administração pública a idéia é que os pedidos estão sendo inventados e que não reflete uma causa coletiva”, argumenta Dione.